PERMUTA E BARGANHA

PERMUTA E BARGANHA

 

Permuta e Barganha

(*) José Hildor Leal

Muitas vezes não consigo acreditar no que leio, mas também não dá para duvidar, porque está mesmo escrito, com todas as letras, símbolos e sinais, bem diante dos meus óculos cansados.

Agora mesmo li que o dono de um terreno na Avenida Paulista, que custa um olho ou até os dois olhos da cara, poderia trocar o imóvel por uma bicicleta sem rodas, que não vale um tostão furado, sem compensação pelo prejuízo, sem torna, sem reposição para equilibrar o negócio, sem nenhum problema, assim no mole, pau-a-pau, taco-a-taco, mano-a-mano, porque numa barganha um perde, e o outro ganha.

É duro, mas foi o que li.

Na verdade, a troca envolveria um imóvel no valor de razoáveis R$ 161.500,00 por outro de módicos R$ 590,91. O texto dizia, ainda, ser irrelevante o valor.

Ulpiano (120 a 180 d.C.) já dizia que “sine pretio, nula venditio” (sem o preço, não há venda).

Tratamos aqui de permuta de imóveis, negócio jurídico ao qual se aplicam as regras da compra e venda, com pequenas modificações, a exigir para sua validade a forma pública e participação de um notário, bem longe da informalidade das negociatas de ocasião.

O que diferencia a permuta da compra e venda é o preço atribuído a cada bem: se o percentual em dinheiro for igual ou superior a 50%, o negócio será de compra e venda.

Arnaldo Wald esclarece: “Se a parte principal do negócio for pagamento em dinheiro, estará sujeito às normas referentes à compra e venda. Se, ao contrário, a troca representar a parte mais expressiva do negócio, aplicáveis ao caso serão as normas a ela atinentes”.

Para Orlando Gomes “Pelo critério objetivo do maior valor, será compra e venda se a parte em dinheiro for superior à outra; será troca, em se verificando o oposto”.

No mesmo caminho segue Clóvis Beviláqua, para quem “pelo contrato de permuta as partes se obrigam a dar uma coisa por outra que não seja dinheiro”, além de Maria Helena Diniz, Paulo Nader, Sílvio de Salvo Venosa, para citar somente estes dentre tantos e gabaritados doutrinadores, por séculos e séculos, ou no mínimo desde Ulpiano até aqui.

Mas é ainda pior. Tem gente dizendo que a permuta de imóvel nem precisa ser por outra coisa, que poderia ser de coisa por não coisa, como trocar um terreno, que é coisa, por serviço, que não é coisa, ignorando que somente será permuta quando se tratar de coisa por coisa, como vimos.

E mais, tem tabeliães dando curso a escrituras nestes moldes, e registradores de imóveis acolhendo escrituras assim.

Não pode!

Gabriel José Pereira Junqueira também esclarece que “não há troca quando um dos contratantes presta ou executa um serviço por um objeto”. Claro, pode haver negócio, mas não será permuta.

Troca, ou permuta, envolve coisa por coisa, bem por bem de valor igual, ou sendo de diferentes valores, com reposição, ou torna em dinheiro, que necessariamente será menor que 50% do imóvel de maior valor – do contrário será compra e venda - buscando o equilíbrio do negócio jurídico, a exigir comutatividade, ou seja, prestações recíprocas e perfeitamente equivalentes.

Isto é permuta. O resto é barganha.

 

* Tabelião de Notas, Especialista em Direito Registral Imobiliário