CESSÃO DE MEAÇÃO E USUFRUTO – ADJUDICAÇÃO OU PARTILHA
* José Hildor Leal
Questão de direito notarial posta à discussão diz respeito à necessidade ou não do meeiro participar da escritura pública de inventário, quando tiver feito cessão com reserva de usufruto.
Caso prático: faleceu A, casado com B, deixando um só filho e um único imóvel de propriedade comum, sendo que B fez cessão de sua meação ao filho, com reserva de usufruto.
A pergunta é se o tabelião deverá fazer o ato como adjudicação, com a presença somente do filho, ou como partilha, com participação também do que reservou usufruto?
Duas respostas se seguiram, uma pela partilha, sob o argumento que não houve transmissão da totalidade da meação, cabendo usufruto ao cedente sobre 50% do imóvel, e nua propriedade ao cessionário sobre esta metade, e propriedade plena sobre a outra metade. E a outra – tese que acompanho - pela adjudicação, sem participação do cedente.
Justifico. Primeiro, porque houve transmissão da totalidade da meação. O fato de haver reserva de usufruto não diminui o percentual cedido. O herdeiro adjudicará todo o imóvel, sendo que 50% em pagamento da legítima, e 50% como pagamento da cessão, com a ressalva de usufruto sobre essa metade.
Certo é que com a cessão restou um único sucessor. Não é pela escritura de inventário que se vai constituir usufruto à cedente; o usufruto já foi reservado através da escritura pública de cessão.
Somente seria caso de partilha se ao contrário de cessão fosse seguido o modelo ditado pelo artigo 518, da Consolidação Normativa Notarial e Registral – Provimento 01/2020, da CGJ/RS, que assim dispõe:
"Os pagamentos a título de sucessão legal, meação ou legado poderão ser integralizados através de direito real de usufruto vitalício, sem prejuízo do pagamento da nua propriedade a quem de direito a receba ".
As situações são diferentes. Na primeira, ocorrendo cessão, seja gratuita ou onerosa, com ou sem reserva de usufruto, o cedente afasta-se da sucessão, ainda que tenha se reservado usufruto, havendo adjudicação pelo único sucessor.
Na segunda, o meeiro recebe em pagamento de sua meação justamente o usufruto, sendo então caso de partilha, pela qual o herdeiro recebe em pagamento de sua legítima não a metade do imóvel em plena propriedade, mas a totalidade dele em nua propriedade; ao meeiro, ao contrário de ter o pagamento de sua meação sobre 50% do imóvel, caberá usufruto sobre 100% dele.
Voltando à pergunta que deu origem ao que trata o texto, ou seja, cessão de meação afasta o meeiro da partilha, ou não, é possível afirmar ainda que sim, que afasta, uma vez que com a cessão resta o filho com direito à totalidade da herança, não havendo partilha, consoante o artigo 26 da Resolução 35, do Conselho Nacional de Justiça:
Havendo um só herdeiro, maior e capaz, com direito à totalidade da herança, não haverá partilha, lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens.
E mais, uma vez feita a cessão, opera-se a transmissão do direito, observada a reserva, tanto que se o cedente viesse a falecer em seguida, não haveria prejuízo à adjudicação, uma vez que o usufruto não é suscetível de transmissão causa mortis.
É possível afirmar que havendo cessão total, com ou sem reserva usufruto, o cedente afasta-se da partilha, devendo a escritura de inventário, na última hipótese, fazer ressalva à reserva. Se assim não fosse não poderia também o nu proprietário alienar o usufruto sem a participação do usufrutuário, e é sabido por todos quanto à desnecessidade.
Por fim, ainda que possa o tabelião entender que o cedente deva participar da escritura pública de inventário, na condição de usufrutuário, mesmo assim certamente o ato será de adjudicação, não de partilha.
*Notário, Especialista em Direito Registral Imobiliário